sábado, 30 de maio de 2015

"Você é especial para mim!"

A exploração que se faz hoje no meio cristão protestante dos milagres, algo que começa a contaminar o meio católico, é passível de uma reflexão, visto que perde-se a cada dia a dimensão desta sobrenatural manifestação de Deus, passível de louvor e agradecimento, para tornar-se motivo de espetáculo e auto-exaltação.
Os milagres, que no dicionário Michaelis é explicado como "Algo de difícil e insólito, que ultrapassa o poder da natureza e a previsão dos espectadores (Santo Tomás)", são presença constante em toda a narrativa bíblica como demonstração da sobrenatural manifestação de Deus que subverte toda a ordem racional dos acontecimentos, e tem uma finalidade. Qual finalidade?
Este é o motivo desta reflexão. Ao se tomar como exemplo a passagem da vida de Moisés a partir do seu chamado a cooperar para a libertação do povo hebreu do cativeiro, ver-se-á que durante sua batalha com faraó através das pragas (Ex 7-12), e posteriormente no deserto, como o caso do maná (Ex 16, 13-31), pode-se perceber que os milagres são uma constante durante sua missão, no entanto, a postura de Moisés é que se deve ressaltar. Quando se chega a Jesus, também se pode observar o Senhor realizando um número enorme de milagres, porém, assim como Moisés, o Senhor tem uma mesma postura.
Qual a postura de ambos? A ênfase não no fato, mas no objetivo do fato. O que as Sagradas Escrituras deixam transparecer na postura de Moisés e de Jesus é a ênfase no fato não é o que importa, nem tampouco na intenção de mostrarem-se como homens acima dos demais cuja figura deveria ser exaltada visto terem uma intimidade maior com Deus, mas ao contrário, Moisés sempre mostrou-se igual a todos, assim como Jesus que nunca negou contato com ninguém: quer fosse leproso (Mt 26, 6) ao rico Zaqueu (Lc 19, 1-10) o Senhor foi acessível a todos, muitas vezes optando por retirar-se quando o queriam exaltar.
Agora, o que se deve refletir mesmo é sobre a real intenção, o objetivo do milagre. Analise-se qualquer um dos milagres tendo Moisés como intermediário: o abrir do mar vermelho (Ex 14, 21-31) ou o fender da rocha de onde brota água (Ex 17, 6), em nenhuma destas duas passagens lê-se na Bíblia uma postura do líder que não seja a de exaltação a Deus pela sua misericórdia e demonstração de amor para com o povo (Ex 15, 13) demonstrando assim que o milagre não era para ser visto como espetáculo, mas como sinal da presença de um Deus que se importa, que se preocupa, e que quer o bem dos seus.
Igualmente se observa na vida pública do Senhor Jesus. Não se encontra outra postura de Jesus ante seus milagres senão de demonstrar aos que contemplam tal ação sobrenatural a manifestação de um Deus que tem especial apreço pelo seu povo. Tanto que na passagem onde os fariseus pedem a Jesus que realize um novo milagre (Mt 12, 38), o Senhor se irrita e devolve-lhes com uma palavra dura (vers. 39). Isto por quê? Por que não entenderam que o que importava não era o fato, mas a intenção do fato.
E hoje, o que se observa, principalmente no meio protestante? Uma ênfase no fato. O que se percebe claramente é uma super exposição do milagre, daí frases de efeito como: "a mão de Deus está aqui!", "venha buscar o seu milagre!", que se tornam uma propaganda com função claramente voltada a arrebanhar adeptos sem, no entanto, ter compromisso com a real intenção do porque do milagre acontecer.
E a real intenção do milagre não é outro senão a manifestação de um Pai que diz: "És precioso para mim..." (Is 43, ), "Você é especial para mim", e para isso age de forma sobrenatural, pois infelizmente, somente suas palavras não são o suficiente para convencer os corações endurecidos, pois se as palavras do Senhor fossem o suficiente para quebrantar corações o que Jesus revelou a Nicodemos: "Eis que Deus amou o mundo (a humanidade inteira, em todos os tempos) que deu o seu Filho único para que todo o que Nele crer não pereça, mas tenha a vida eterna" (Jo 3, 16), seria o necessário.
Assim, segue-se observando os equívocos acontecerem, e por isso tão fácil de se entender porque templos tão cheios de homens e mulheres que gritam, berram, choram clamando por milagres, que são até alcançados, mas que não se configuram em transformações de caráter, moral, posturas éticas nem virtuosas, que não são capazes de verdadeiramente levarem-nas a se apaixonarem por Cristo e desejarem segui-lo como foi com Maria Madalena ou o Apóstolo São Paulo; muito pelo contrário, o que se observa é que ao "secarem as comportas do céu" o restará ao Deus dos milagres será o abandono.
Desejar a Deus e a sua presença que é paz e gozo no Espírito (Rm 14, 17) deveria ser muito mais vital que o milagre por si só, que evidencia o poder de Deus, mas não necessariamente produz intimidade entre Pai e filho, que é o que deseja o Senhor. Busque o Deus dos milagres (que antes de tudo é Aba, paizinho, pai querido), e não somente os milagres de Deus!
Deus te abençoe em nome do Nosso Senhor Jesus Cristo.

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