segunda-feira, 1 de junho de 2015

"O céu é o bem maior" (Continuação de "Você é especial para mim")

Em continuidade ao que foi refletido no texto anterior, "Você é importante para mim!", um outro aspecto relativo ao super marketing que se observa no que diz respeito aos milagres, além da exploração do fato em si em detrimento do objetivo do fato, é uma consequência desta prática que, a princípio passa despercebida, mas que faz-se imperioso abordá-la.
De que consequência se trata, então? Não desejo dar a resposta de pronto, mas convidar os leitores deste texto a raciocinarem comigo e assim chegarmos à consequência de que falo, sem contanto arvorar-me em tomar meu ponto de visto como o correto, mas buscando instigar cada um a refletir e concluir se concorda, ou não.
Vejamos. Ao se utilizar os milagres da forma que se tem utilizado, dois aspectos tornam-se passíveis de questionamento: primeiro, a forma como os milagres estão sendo vistos pelas pessoas que o buscam: como sendo uma forma especial de tratamento de Deus; algo como: "Se recebo milagres é porque sou visto, percebido por Deus", e assim, alcançar um milagre se torna, mais que graça, um status. E quanto mais milagres receber, tanto mais diferenciado para com Deus torna-se. Isso faz com que o marketing das igrejas que exploram o milagre deixe a entender na mente de alguns que, saindo "desta igreja" onde nunca alcanço nada e indo para "aquela igreja" onde se alcança tudo serei, finalmente, vista pelo Senhor.
Porém, não é esta a consequência que desejo refletir, não que não seja tão importante, é muito sério. Mas o segundo aspecto é o que desejo abordar; aqui está a consequência que faço menção na introdução. Observe-se que, ao se explorar o "direito" de receber os milagres de Deus a partir da utilização de passagens dos Evangelhos, como o de São Mateus onde Jesus textualmente diz: "Pedi e se vos dará..." (Mt 7, 7), ou, "Tudo o que pedirdes na oração , crede que o tendes recebido, e vos será dado." (Mc 11, 24), ladeada por pregações carregadas de "teologia da prosperidade" onde se ouve: "Deus quer te dar o melhor desta Terra", ou "Você nasceu pra ser vencedor", ou ainda, "Se Deus permite riqueza aos ímpios porque não permitirá aos que Lhe seguem?", e assim, não sei se conscientemente, ou não, cria-se uma perigosa cultura materialista.
Por quê perigosa? Porque ao pregar que "tenho direito a conquistar as delícias deste Terra" sem, no entanto evidenciar o que realmente interessa, passa-se a suscitar nas pessoas um apego às "coisas desse mundo" levando, assim, as pessoas a voltarem seus olhos, e seus esforços ao que é passageiro, ao que o Senhor Jesus denomina "tesouros que a traça e a ferrugem corroem e os ladrões furtam e roubam" (Mt 6, 19), e pior, prende as pessoas a este mundo indo de encontro ao que Jesus recomendava: "Buscai em primeiro lugar o reino de Deus..." (Mt 6, 33), e que foi explicitado na mensagem de São Paulo quando recomendava: "Buscai as coisas do alto, afeiçoai-vos as coisas lá de cima" (Cl 3, 1-2).
 A consequência que fazia referência é esta: a exploração exacerbada dos milagres com mero viés financeiro está criando cristãos materialistas e imanentes (presos às realidades desta vida), enquanto que o Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo ao qual disseminou e mandou que os Apóstolos e sua Igreja dessem continuidade "sem acrescentar nada" (Ap 22, 18) contém uma mensagem transcendente, e isto está plenamente evidenciado na passagem de Mt 5, 20 onde Jesus diz: "Ajuntai para vós tesouros no céu...", e recomenda que nosso coração esteja voltado para esta realidade, pois, "onde está o teu coração ali está o teu tesouro" (Mt 5, 21).
Esta mensagem carregada de transcendência, de desejo do céu, da vida eterna, foi tão impactante nos primeiros tempos da Igreja que diz o Atos dos Apóstolos que os convertidos "vendiam tudo" (At 2, 42), abraçavam a fé e seguiam agora numa caminhada de "estrangeiros" rumo à "pátria" definitiva (Hb 11, 16).
Milagres são parte da vida cristã e todos o desejam, inclusive eu; no entanto, da forma como se tem mostrado e pregado não tem sido a forma mais condizente, pois eles devem ser vistos, antes de tudo, como dito no texto anterior, e que reitero aqui, como forma de manifestação de Deus que diz: "Você é especial para mim".
Ao nos encontrarmos com Ele um dia não nos cobrará o número de milagres que recebemos, mas a capacidade de termos percebido em cada um deles a Sua manifestação amorosa que de alguma maneira queria colaborar para a nossa salvação, para nos tornar "cidadãos do céu" (Fl 3, 20). Àqueles que tiveram a percepção correta e responderam com a entrega de sua vida a este gesto de amor, certamente a consequência será a glória eterna. No entanto, para aqueles que somente souberam amar a graça, e não o autor da graça, correm sério risco de não gozarem do bem maior que torna qualquer milagre nesta terra uma mera migalha: o céu.
Não incorra neste erro! Deseje os milagres de Deus, mas deseje acima de tudo, o próprio Deus.
Deus te abençoe em nome do Nosso Senhor Jesus Cristo.

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