quarta-feira, 12 de novembro de 2014

O social ou o homem?

O Papa Francisco no encontro com os movimentos sociais declarou: "Nenhum trabalhador sem direitos! Nenhuma família sem moradia! Nenhum camponês sem terra! Realmente, a opressão, a expropriação, o alijamento de direitos, o subjugamento de um ser humano por outro é algo inaceitável, pois gera descalabros e desigualdades que, principalmente para os que carregam na sua vida os parâmetros evangélicos, como o Santo Padre, mostram-se inaceitáveis, e por isso ser compreensível tal anseio exposto em suas palavras.
No entanto, a reflexão que postulo externar neste texto, com o desejo de para além de polêmicas, ou de más interpretações, mas com o intuito de apenas balizar um pensamento que me advém à mente, é que o social foi alvo, sim, da ação generosa e amorosa de Nosso Senhor Jesus Cristo quando da sua vida pública; porém, o meu questionamento é: Jesus preocupou-se mais com o social ou com o homem?
Algumas passagens dos Evangelhos podem nortear este meu questionamento e, quiçá, possam elas corroborarem ao argumento que aqui apresento. Um primeiro exemplo é a passagem da conversão de Zaqueu: o texto narra claramente que em Jericó havia um cobrador de impostos, Zaqueu (burguês, rico, opressor) que subjugava o povo ao se utilizar do seu poder para exigir o dinheiro devido, que o enriquecia, e fortalecia o poder maior: o império romano, e assim produzia uma profunda desigualdade, um forte sentimento de "exclusão", uma tensão de classes, e um desejo da parte sofrida que aquele sistema opressor em que estavam mergulhados fosse posto abaixo e uma nova sociedade, justa, fraterna, solidária, tomasse seu lugar. Quem faria eles já sabiam: o Messias de Deus.
E o Messias veio, e passou por Jericó e teve um encontro com Zaqueu; e naquele encontro, somente os dois, frente a frente, sem acusações ou censuras, emergiu daquele diálogo um novo Zaqueu transformado, não de fora para dentro, mas de dentro para fora, que passou a ter, a partir dali a plena consciência que o outro é relevante, que o próximo tem valor inestimável, daí a sua atitude: "Senhor, vou dar a metade dos meus bens aos pobres e se tiver defraudado alguém, restituirei o quádruplo" (Lc 19, 8). A transformação daquele cobrador de impostos começaria a mudar toda uma conjuntura naquele âmbito social; o ódio, a aversão, a intolerância que pairava naquela relação estava posta abaixo, pela ação de Deus agindo no homem que é o agente social principal.
Um segundo exemplo é o da passagem da multiplicação dos pães (Jo 6): ali o texto sagrado deixa evidente a decepção de Jesus com uma multidão que o seguia, pura e simplesmente, para ter a possibilidade de comida fácil e farta, o que suscita, então, a reclamação do Senhor: "Em verdade, em verdade vos digo, buscais-me, não porque vistes os milagres, mas porque comestes dos pães ficastes fartos. Trabalhai, não pela comida que perece, mas pela que dura até à vida eterna que o Filho do homem vos dará." (Jo 6, 26-27)
A necessidade do pão na mesa, ou seja do alimento, verdadeiramente, é uma das situações mais deprimentes e inquietantes para qualquer pessoa ou família, juntamente com a perca da saúde, tanto é que o que mais Jesus fez foi curar e alimentar (mais espiritualmente que fisicamente, diga-se de passagem), e era justamente do "alimento espiritual" que reclamava naquele momento. O Senhor não fazia pouco caso, ou era indiferente a situação daquela massa que o seguia, um povo que sofria o flagelo da falta de oportunidades, de emprego digno, de terra para lavrar, de condições mínimas que permitissem uma vida digna para si e suas famílias, e que erma formadas na maioria pela soma dos "excluídos" da época: órfãos, viúvas, estrangeiros, mendigos, enfermos, endividados, enfim aquilo que forma o maior contingente, mas que no entanto, olhavam apenas para sua condição social concreta, imediata, e no entanto, o Senhor fazia alusão há algo maior: a fome que já haviam até esquecido, a fome de Deus.
Quando Jesus expõe sua proposta de Ele mesmo agora ser o "Pão" a ser comido, e o "vinho" a ser bebido, entendem como absurdo e simplesmente vão embora. Qual o por quê disso? O apego à materialidade, enquanto que acima disso está a transcedentalidade: eu tenho fome de alimento físico, mas tenho fome maior de céu, de salvação. E isso só acontece numa transformação interior, e os discípulos, principalmente Pedro, já haviam despertado para isso quando ao serem indagados pelo Senhor se não desejavam ir com a multidão Pedro responde a Jesus: "Senhor, a quem iremos iríamos nós? Tu tens as palavras da vida eterna." (Jo 6, 68). O que será mais eficaz: um benefício que possibilita o "pão" à mesa, ou uma Palavra de Vida Eterna que põe salvação na alma?
O Santo Padre não explicita nada mais do que aquilo que é a missão da Igreja de Jesus: proclamar, e rememorar a todos que não abre mão da DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA. Terra, teto e trabalho são fundamentais, pois trazem embutidos em si os dois princípios dessa dignidade: Liberdade e felicidade. Todavia, isso não pode ser mera construção do esforço humano, embasado em ideologias ou filosofias, mas acima de tudo, e principalmente, tem que ser fruto da ação de Deus que, repito, transforma de dentro para fora, pela ação do Espírito Santo, e não de fora para dentro como mero mecanismo de mudança de mentalidade ou comportamento.
Deus nos ajude por meio do seu Santo Espírito a sermos particularmente restaurados em corpo, mente, alma e coração, para assim sermos agentes transformadores ao nosso derredor para que assim essa visão se espalhe, e quando menos se pensar será uma sociedade mais justa, fraterna, e santa, sendo produzida.
Deus te abençoe em nome do Nosso Senhor Jesus Cristo.

Nenhum comentário:

Postar um comentário